A família de verão. São Martinho do Porto

Era verão, o sol estava lá como em todos os verões. O calor que se fazia sentir este ano, naquela pequena vila do Oeste, agora moderna, era mesmo demais. Dizem que é por causa do ozono e das alterações climática. Não acredito muito. O ozono já mais poderia provocar assim tanto calor e as alterações climáticas, enfim, tenho as minhas dúvidas. A família de Lisboa, que todos os anos por cá passa, já havia chegado. Para além do irmão mais velho, que por aqui está muitas vezes, estavam as duas irmãs, este ano mais bonitas e mais sofisticadas. A diferença de idades que no passado existia parecia já não fazer sentido. A mais velha, mais serena, tinha adquirido com o passar do tempo uma pose distinta, quase maior que o mundo. A mais nova, este ano estava fresca, colorida, como se o universo se estivesse a abrir a seus pés. Era uma família normal, equilibrada. Deslocava-se regularmente à praia, como se cada membro soubesse um papel na perfeição e tudo aquilo que devia fazer e quando fazer. Gostava de ver. Facto é, que a sua chegada, a chegada da família de Lisboa, tinha feito animar o verão. O sol, de que falava, parecia agora mais quente, e até o mar mais azul. Tudo estava muito mais colorido. Porquê? Perguntava-me eu? Os dias passavam e eu, do meu lugar de observação, assistia a este desfile de cor e de alegria a cheirar a verão, que queria que nunca mais acabasse ou tivesse fim. À noite vinham todos à rua. As noites quentes moldavam as emoções e o espírito desta família. Os mais velhos, intocáveis, saíam sempre primeiro num traje desportivo refinado, encontravam-se com os amigos “de verão” já de longa data. As manas. Aí as manas! Com estas tudo era diferente. O tempo em casa que demoravam a mais antes de sair, reflectia-se num traje “in” hippie chic, bem à moda da elite lisboeta. A sua luminosidade fazia sorrir a lua e dava graça a sua existência. Deviam ir acabar a noite na Foz, onde por aqui se alegram as noites de verão faz tanto tempo. Foi esta dança de alegria que deu graça a todo aquele mês de Agosto, dia após dia, noite após noite, até chegar aquele dia à tarde. O carro grande escuro que tinha visto chegar nos primeiros dias do mês estava agora de mala aberta e família de que vos conto, hoje não tinha o seu sorriso e luz habitual. Partiram. Para trás, ficou a vila modesta, agora vazia, eu e o fim do verão. Eu perdi o espectáculo colorido que me alegrava os dias, o verão e o sol deixaram de ser tão quentes, o mar tão azul e no céu já se alcançavam algumas nuvens. O que será feito da família de verão? Temos que esperar até ao ano seguinte. Ela nos trará um novo verão, quente, colorido e seguramente sempre divertido.

Andar perdidamente ao sabor do tempo

As férias estão aí. As férias são sinónimo de praia, de mar e de sol. Porque o sol é sempre pouco e sinto que o tenho de aproveitar, explorar, usa-lo até ao último raio. Sinto-me num estado de “banho-maria”, de “stand-by”. Sem grandes sobressaltos, inquietações, ou preocupações. Estou tranquilo e a precisar deste sossego, porque nem sempre é fácil encontrar um ponto de equilíbrio dentro de nós próprios. Aliás, muitas vezes, as maiores batalhas são travadas connosco e não com os outros. Sei que ficam assuntos por resolver, alguns são delicados, mas o não falar deles não os apaga, apenas os esconde. Sei que uma canção traz tanta coisa ao cimo que não era provável. Agora é manter a fé e a esperança, porque o Amor, é o único capaz de vencer qualquer batalha...Há sentimentos que perduram apenas porque são verdadeiros, mas é tempo de não pensar, é tempo de seguir, mesmo que olhando sempre por cima do ombro para não perder o rasto do nosso caminho. Depois de tantas batalhas, encostei todas as armas e estou ao sabor do vento. Que a vida me dê o que ache que seja justo ou que eu merecer. As férias estão aí. As férias estão aí e dentro de dias e eu quero apenas sorrir, não por ninguém mas por mim. Considero a praia dos Carneiros uma das praias mais bonitas do Brasil. Não estive em muitas, mas pelas que vi, assim o digo. A praia dos Carneiros é selvagem e encantadora. É praia de cinema, de propaganda, daquelas com direito a coqueiros na areia que tombam sobre o mar.... é para aí que vou. Este pequeno paraíso está a cinco quilómetros da vila de Tamandaré. Não é fácil lá chegar mas é bonito, calmo e isolado. Na praia não há nada, só a Igreja de São Benedito, também conhecida como a "Igrejinha dos Carneiros". Uma igrejinha centenária na beira-mar, em confronto com as águas escuras do rio Formoso e com as águas cristalinas do oceano Atlântico. Ainda mangueirais que cercam a praia de areias brancas, sem marcas de pegadas, sem despojos humanos, só restos de raízes e troncos de coqueiros que crescem há anos na areia....já me imagino lá. Gosto do acesso, que é difícil, para quem vem de Tamandaré ou de outro lugar qualquer. Será que é por isso que este local está assim bem conservado e continua relativamente pouco frequentado? O melhor acesso a este cenário fantástico, é pela estalagem da Praia dos Carneiros, que fica no alto de uma colina, com uma vista verde e soberba. Para chegar à praia é necessário um transporte todo o terreno e uma lancha. O trajecto pelo estuário do rio até a praia já vale pela belíssima paisagem. Estou de partida. É pois tempo de não ter pressas ou chatices, de por o mundo de lado. Estou assim, e assim quero continuar nos próximos tempos. Sem cobranças ou exigências, sem esforço ou preocupações. Com a certeza de que o destino é o caminho, e que tudo ficará bem. Que o caminho certo é deixar-me andar. Andar perdidamente ao sabor do tempo com a praia por companhia.

Argentina e Chile - A geografia dos grandes lugares


Desde que aterramos em terras do continente sul-americano (Buenos Aires), percorremos mais de 9.000 kms, entre avião, carro e alguns barcos. Em apenas dois países (Argentina e Chile), saltamos dois fusos horários e cruzamos várias zonas climáticas. Viajamos de Buenos Aires ate ao sul do mundo Terra do Fogo (Ushuaia) a uns escassos kms do continente Antárctico, para daí continuar para a Patagónia (Porto Natales e Punta Arenas) terra insólita e incrivelmente solitária. Daí, ainda para o norte do Chile, terminando apenas a 7 km da Bolívia, em pleno altiplano andino, onde o ar e pouco e nos custa a respirar.

Fomos do nível do mar, aos 4.350 metros de altitude, no coração dos Andes Chilenos; dos -8 graus - Inverno puro, aos 35 graus - Verão tropical, obrigando o nosso corpo a alterações constantes e sobretudo a uma diversidade de bagagem indescritível. Do percurso, fica-nos na memoria idêntica diversidade: as grandes massas de gelo, os lagos sem fim, os fiordes que tocam os céus, os vulcões em actividade, os géisers que jorram águas escaldantes das entranhas da terra, os desertos secos, os lugares insólitos e solitários e os espaços imensos que nos custam a classificar.

No sul do mundo, vimos grandes glaciares, mares onde icebergs (têmpanos chamam-lhe por lá) flutuam e onde os leões-marinhos e as focas são efectivamente os reis (mais não seja pela sua adaptação natural a um ambiente tão hostil) e florestas vistosas onde os grandes lagos se misturam com as montanhas nevadas. O caso do Parque Nacional da Terra do Fogo, que mesmo os dias de neve não fizeram perder o encanto. Quanto ao facto de ser efectivamente o "fim do mundo", ficaram-nos algumas dúvidas, já que ainda temos a Antártida por descobrir.

Num salto de gigante, mas que num país tão grande perde significado, encontramo-nos com as belezas patagónicas, numa mistura de estepe e de montanhas, que só o ver nos faz crer. Aqui, os animais do sul, dão o lugar aos milhares de ovelhas e guanacos (uma espécie de Lama do sul) povoando ora as estepes ora o lugar encantado que é o Parque Nacional das Torres del Paine.

Após uma visita curta a capital, Santiago do Chile, rumamos ao grande deserto de Atacama, estabelecendo base em San Pedro de Atacama. Esta é sem duvida a terra do nada, mas que ao mesmo tempo é detentora de uma paisagem única. É o lugar mais seco da terra e ao mesmo tempo o lugar onde o céu nocturno é mais bonito, pelo facto de praticamente não haver humidade no ar, poluição ou mesmo luz eléctrica. Daqui, fica-nos a memória de um espaço enorme, da presença imponente dos Andes e dos flamingos rosas dos lagos de sal do Salar de Atacama. De facto, a geografia dos grandes espaços, tem aqui o seu apogeu.

Depois foi o longo e penoso regresso! Trazemos na nossas memorias um conjunto de recordações que já nos fazem saudades e na bagagem perto de 1000 fotos que nos vão ajudar a não esquecer estes 15 dias que, seguramente, valeram por muito mais. Afinal não é este o gosto de viajar? Fica a promessa de partilhar neste espaço mais alguns relatos desta maravilhosa viagem e algumas fotos, testemunhos, destas paisagens e desta aventura.

Duas horas de liberdade. Paris

Acabo de regressar de Paris, onde fui “em trabalho” como se diz, apesar de ser verdade. O tempo passa, as novidades surgem, e a cada momento surgem novas viagens, novos destinos, encantadores, e cada vez mais exóticos. Contudo, Paris mantêm o seu charme, não passa de moda e mantém-se atractivo para muitos milhões de turistas de todas as partes do mundo, cerca de uma média de 30/35 milhões de visitantes por ano, dizem.

Confesso sem receio que Paris não foi uma das minhas primeiras paixões. Na linha da frente sempre esteve, Barcelona, Nova Iorque, Londres, ou até outras como Buenos Aires. Mas, como dizia, as vontades mudam e o tempo provou-me que, afinal, Paris, é mesmo uma das belas cidades do mundo. Apesar dos seus incontornáveis, a Torre Eiffel, o Museu e as Pirâmides do Louvre, o Arco do triunfo e a Notre Dame, Paris é muito mais. Paris é vida, é multiculturalidade, é uma fonte inesgotável de energia e de inspiração.

Por tudo isto e mesmo indo “em trabalho” gozei de duas horas de liberdade, que me deixaram andar pelo “meu” Paris. Todos nós temos as nossas cidades, e eu tenho o “meu” Paris.

Do largo du Senat (Odeon, perto do Jardim do Luxemburgo) onde sempre fico, sigo em direcção a Rua Bonaparte – Place de Saint Suplice, para uma ida rápida à Maison de la Chine e à Shangai Tang. Um lugar encantador para os amantes do Oriente e uma experiência para os sentidos. Pelo caminho, detenho-me, admirado, num cartaz que transporta o nome nacional. Continuo até ao Boulevard de Saint-Germain de Prés para passar a ponte pedonal sobre o Sena. Paro um pouco para ver os artistas de rua e olho o rio. Percebo agora porque é que lhe chamam a Cidade-luz e como tem sido fácil manter esta mística viva. Com a vista da ponte, reconheço que deve ser uma das capitais mais bonitas da Europa.

Cruzo os Jardins do Louvre, vejo centenas de turistas entusiasmados, apresso o paço para passar o sinal verde na rua do Rivoli. Ao virar da esquina entro na Rue de Saint-Honoré, umas das minhas preferidas do “meu” Paris. Vou à Colette ver as novidades, detenho-me nalgumas montras e paro para um café quente no Café com o mesmo nome da rua. São os locais como este e toda esta atmosfera que, não obstante as muitas centenas de guias e reportagens que têm sido escritas a seu respeito, ainda faz com que valha a pena investir tempo, energia e dinheiro numa nova viagem a Paris. É bom estar aqui!



Pago a bebida e prossigo. A rua de Saint-Honoré é inesgotável de novidades e glamour. Chego à Place de La Concorde e olho para o relógio. As minhas duas horas de liberdade estão a chegar ao fim. Apanho o metro e as novidades sucedem-se a um ritmo eloquente. Um concerto improvisado no subsolo alegra o dia cinzento da rua. Abrando o paço e quando me apercebo, já uns minutos passaram. Momento único de prazer. Dei por mim neste instante, muitos anos depois da minha primeira visita a Paris, fascinado por esta cidade. Apanho o metro para La Defense, entro no Palácio de Congressos e momentos passados, dou por mim já mergulhado na verdadeira razão de ali estar, deixando lá fora, já esquecida, a grande cidade. Voltarei em breve.


Carta do paraíso.

Que bom foi receber esta vossa mensagem aqui tão longe. Vocês estão óptimos. Como os putos estão grandes desde o Natal. Como vez o tempo está óptimo. Estou super contente de me ter decidido ao fim deste anos todos. O tempo passa calmamente, e os dias são uma sucessão de prazeres e de encantos. Os azuis do mar e do céu inspiram-me e deixam-me absolutamente sereno. Desde que cheguei nunca mais vesti um par de calças. Os chinelos já são um traje de luxo! O investimento foi, como sabes, pesado mas tudo está a compensar e a correr as mil maravilhas. A casa está quase terminada. Este tem sido por hora o nosso grande objectivo. Claro que não me esqueci da tal varanda, disposta para o por do sol, como em tempos te contei. Em breve está pronta para longos pequenos-almoços e longas horas de prazer. Resolvemos afinal por 3 quartos, todos com vista para o mar, contamos receber muitas visitas. No entretanto já contratámos a Juanita que nos ajuda na lida da casa e a manter tudo isto em ordem: compras, roupas, etc. Porque isto das ilhas sempre também dá um certo trabalho. É simpática e eficaz. O marido dela “et sus muchachus” é que nos estão a construir a casa. Na verdade não tivemos outra escolha, pois só eles o fazem por aqui. A casa terá pouco tijolo, será sobre tudo madeira e outros materiais que a ilha dispõe e por isso também mais baratos. Eles dizem que resistirão até a furacões. Eu duvido. Mas bom, temos que confiar em quem sabe. (…) Tive de parar de escrever por uns minutos, pois está um calor sufocante e fui dar um mergulho. Temos o mar a uns escassos metros de casa. É prático. Calcula que quando regressei aqui a esta minha mesa de trabalho ainda improvisada, a Juanita tinha-me acabado de preparar um magnífico suco de papaia com lima e três gotas de gin (já sabes como gosto de gin e do sabor da lima!) mas com este calor!!! Meu Deus. À tarde vamos para o mar, desfrutar deste azul-turquesa inigualável. Daremos apenas uma pequena volta para testar uma embarcação simples que compramos sobretudo para não depender de terceiros no que toca a pequenos passeios. Compreendes. Viste a cabana da praia? Corresponde à parte de trás da ilha. Foi a primeira construção que fizemos, para não estar-mos tão expostos ao sol. De tarde a praia é melhor aqui. Assim podemos dormir longas sestas sem correr riscos. Uma referência as pessoas da aldeia. São boa gente e acolhedora. Na verdade são meia dúzia por assim dizer e ao fim destas semanas já os conheço quase a todos e todos já nos conhecem também. Acho que nos vamos dar bem aqui. Por ora, não sinto falta de nada, enche-me o coração toda esta paisagem e a concretização deste pequeno grande sonho. Conto convosco para não deixarem a saudade crescer. Quero eu dizer com isto, que em breve conto com vossa visita. São apenas algumas horas de voo. Eu próprio providenciarei a vossa vinda até aqui à ilha. O Tenente Pablo (um ex-piloto da IBERIA agora reformado) mantêm um pequeno hidroavião é faz isso por uma pechincha. Um abraço e ate breve.

Quem vê Goa, não precisa de ver Lisboa. Fuga à província de Goa e a Bombaim

O meu guia da Índia (sou viciado no Lonely Planet) começa assim “Are you realy, realy sure that you want to go to India?” Assustei-me mas não lhe dei muita importância. Uma vez regressado compreendo agora o porquê da questão. Na Índia tudo é diferente. A cor, as pessoas, o calor, os cheiros, as comidas, os monumentos, até o verde acho que é diferente… mais indiano. É um país que tem tanto de maravilhoso como de hostil; tanto de riqueza como de pobreza; tanto de atractivo como de repugnante. Uma coisa tem certamente, um encanto enorme para quem o descobre e está pronto para o embate cultural. O nosso destino era a província de Goa incluindo uma visita à mega cidade de Bombaim. Lá fomos. Lisboa para Zurich, de Zurich para Bombaim e de Bombaim para Goa. Ao cabo de mais de 30 horas aterramos em Goa com 34 graus centígrados, cansados mas cheios de expectativa. Estávamos finalmente na Índia. Não fomos decepcionados pelo lugar. Goa é um lugar incrível, com uma micro cultura indo-portuguesa, onde por vezes é difícil de discernir contornos de cada país e nos faz crer que o passado, longínquo, foi afinal só ontem. Vimos praias de encantar, mercados de mil cores, igrejas de santos conhecidos (S. António, S. Francisco Xavier…), templos hindus carregados de uma espiritualidade distante mas por isso também mais fascinante e conhecemos pessoas de apelidos familiares: o recepcionista Sr. Domingos e o nosso sempre prestável condutor Ribeiro. Á noite provava-mos os petiscos do lugar: Xacuti e Cafreal, Caris e Massalas. Tudo muito picante (por vezes até de mais), mas gostoso e não menos interessante. Já em jeito de regresso, fizemos uma paragem em Bombaim e foi aqui que melhor percebi a questão inicial do meu guia. A Índia mostra-se no seu esplendor. O pior (barracas e milhares de famílias a viver nas ruas, detentoras de uma miséria citadina não humana) mas também o melhor (palácios dignos de Marajás, monumentos emblemáticos e templos místicos). A Índia no seu contraste permanente, e o rubro de uma massa humana impar. Deixamos Bombaim para fazer todo o percurso inverso, primeiro Zurich e finalmente Lisboa, onde esperava-mos aterrar umas quantas horas depois e seguramente de rastos. De regresso ao aeroporto internacional de Bombaim e apenas a algumas horas de deixar este mundo de contrastes que é o sub-continente indiano, olhava pela janela do carro e enquanto via a grande marginal da Cidade de Bombaim e o reflexo brilhante das luzes no mar quente do Índico, percebi que afinal não se tratava do fim mas antes do início de uma grande descoberta que tenciono continuar. (Texto e foto publicados no suplemento Fugas, Público em 4 de Outubro).

Uluru (Ayers rock), Australia. De refugio espiritual à experiência do centro vermelho australiano.

O Parque nacional de Uluru-Kata Tjuta, é terra de gente aborígene, os donos tradicionais do Uluru, os Pitjantjatjara e os Yankunytjatjara ou Anangu já nos tempos modernos. O maior postal ilustrado da Austrália é o famoso Uluru, ou Ayers Rock como todos o conhecem. Uma rocha monumental, única no espaço amplo do deserto vermelho australiano, com 3,6 quilómetros de cumprimento e um total de 348 metros de altura. Acredita-se que dois terços da rocha continua enterrada no solo, esperando que os ventos fortes do deserto nos revelem mais mistério. Toda a gente o conhece pela sua cor avermelhada e por mudar de cor à medida que o sol se põe, revelando um conjunto de vermelhos intensos e escuros antes que se transforme num cinzento que acompanha a noite, já com algumas estrelas a compor o horizonte. O espectáculo repete-se de forma inversa ao amanhecer, apenas com alguns espectadores a menos, mas também por isso mais belo. De fenómeno natural passou rapidamente a fenómeno turístico, atraindo a curiosidade a espectadores de todos os lados do mundo e de todas as idades. Desde os anos cinquenta que move, primeiro curiosos, depois cientistas, agora turistas. Turistas que transformam o acontecimento numa romaria digna de ser observada. Na verdade esta rocha misteriosa oferece muito mais que bonitas cores, pois toda esta área possui um significado cultural muito importante para o povo aborígene local, os Anangu. Para esta comunidade aborígene, Ayers Rock, ou Uluru, como a baptizaram, e também nome do parque natural que rodeia a rocha, é um lugar de culto, um lugar sagrado, ligado às suas tradições ancestrais. Um passeio à volta do Uluru permite a visita a alguns dos pontos mais representativos da cultura deste povo, deixando-nos apreciar a suas cavernas e pinturas rupestres, em tempos utilizados em rituais e cerimónias. Permitirá ainda contemplar Mutijulu, um lago formado por um furo natural e permanente de água, já no lado sul do Uluru. Segundo conta a Mala tjukurpa, a tradidicional lei falada do povo aborígene, resultou de um combate entre duas serpentes ancestrais Kuniya e Liru. O passeio completo pela base do Uluru dura 5 horas e dista cerca de 10 quilómetros. Para os mais aventureiros existe ainda a oportunidade de subir a rocha. Durante anos, subir ao Uluru era considerado o ponto alto de uma viagem ao grande centro vermelho da Austrália. O crescente respeito pelas tradições aborígenes tem porém invertido alguns hábitos. Subir ao Uluru vai contra as crenças espirituais aborígenes e o povo Anangu prefere que isso não aconteça, já que o percurso seguido pelos visitantes é associado às tradições ditadas pela Mala tjukurpa. Tratando-se da sua terra sagrada, o povo Anangu assumem-se como responsáveis por todos aqueles que andam pelo Uluru, e sentem bastante tristeza quando os visitantes se ferem ou morrem na rocha. O povo local chama aos que sobem a rocha os Minga Mob, e riem-se de longe dos que o fazem. Ainda que o número de visitantes ao Uluru tenha crescido muito ao longo dos anos, o número pessoas que sobem a rocha tem decrescido. Mas o encanto do grande centro vermelho australiano ultrapassa esta grande rocha. Um grande espaço vazio, onde tudo é céu e terra vermelha, e a única direcção possível parece ser uma estrada infinita. As distâncias são longas e as viagens carecem de um planeamento eficaz. Uma visita ao centro da Austrália é uma magnífica experiência mas, mais que isso, foi o concretizar de um sonho de criança.